No Festival de Publicidade de Cannes, anúncios nos moldes tradicionais perdem espaçoAgências apostam em nonsense e experimentação; Brasil não se destaca nessas campanhas porque verbas e prazos de criação são menoresCRISTIANE BARBIERIENVIADA ESPECIAL A CANNES A Coca-Cola está se tornando uma empresa de entretenimento. As bebidas e o estilo de vida alegre continuarão sendo vendidos, mas a empresa abrirá lojas e venderá produtos, episódios e jogos de sua Fábrica de Felicidade, a campanha publicitária que mostra o mundo dentro das "vending machines" de Coca, com direito a dezenas de personagens e aventura."A Coca-Cola sempre criou bons personagens e histórias, como aconteceu com o Papai Noel [cuja imagem foi criada pela empresa] e com os ursos polares, feitos há 20 anos", diz Ivan Wicksteed, diretor de criatividade global da Coca-Cola. "Mas agora temos uma verdadeira história sem fim, com muitos personagens e motes arquetípicos. Acabamos de lançar o segundo episódio e pretendemos continuar com eles por mais 20, 30 anos. Vamos fazer dinheiro com os filmes."Os episódios não ficam a dever a estúdios como Pixar ou Disney. Mas, por trás, há alternativas de comunicação sendo testadas por agências e anunciantes para buscar o consumidor que parece estar cansado da propaganda tradicional.Depois de assistir a parte dos mais de 50 seminários, 20 workshops, quatro cerimônias e 28 mil peças de propaganda, os 12 mil participantes do Festival de Publicidade de Cannes, que terminou ontem, voltam para casa com algumas idéias e poucas certezas. Para muitos publicitários e anunciantes ouvidos pela Folha, a maior certeza é que a comunicação está descobrindo novas formas de ser feita a cada dia.Apesar de acreditarem que sempre haverá espaço para anúncios tradicionais, os especialistas da área têm se dedicado, por exemplo, à experimentação. Uma das campanhas para TV mais comentadas -e candidata ao Grand Prix de sua categoria- mostra um gorila tocando na bateria uma música de Phil Collins. No fim, aparece uma barra de chocolates Cadbury, mas poderiam ser pilhas, sapatos ou outro produto. O fato de o nonsense ser comentado, diziam muitos publicitários, já é relevante para provocar e atrair o consumidor. Um dos seminários mostrava filmes experimentais e cults.Depois de julgar mais de 400 peças da categoria Titânio e Campanhas Integradas - na qual são classificadas peças de áreas que não são muito claras-, Sérgio Valente, presidente da DDB Brasil, diz que ações como a da Coca-Cola são uma das três pernas que sustentam a nova tendência da comunicação. "A primeira delas é que, ao invés de seduzir o consumidor, a propaganda agora busca influenciar seus hábitos." Assim, cria personagens e mundos de boas histórias de ficção para fazer parte das coisas que gosta."As pessoas ficaram mais céticas com o que se anuncia", afirma Aurélio Lopes, co-presidente da GiovanniDraftFCB. "As marcas estão buscando fazer os consumidores falar e dar seu aval a elas."Outra parte do tripé de Valente é deixar de falar da relevância do produto para colocar à frente a do consumidor. "O consumidor não quer mais ser influenciado, ele quer influenciar. Ele quer ser tratado por nome, sobrenome e apelido." É o que faz, por exemplo, a campanha do jornal indiano "The Times of India"", que conclamou a população a mudar o país e conquistou 100 milhões de votos por celular para eleger novos líderes políticos. Ao mesmo tempo em que muda a imagem, vende mais jornais.Por trás disso está o fenômeno das redes sociais, que movimentam quase todas as grandes campanhas integradas. Foi assim com um dos Grand Prix de internet, que mostrava, a cada cinco segundos, uma pessoa dançando um tipo de música com uma roupa diferente da rede de lojas japonesa Uniqlo. A campanha conquistou de tal maneira os japoneses que praticamente todos os blogs do país tinham um ícone remetendo a ela. "Temos de aceitar que o anunciante perdeu o controle da campanha porque em todas as áreas há convite para o diálogo", diz Lopes.Apesar de dizer que não existem mais divisões geográficas na comunicação, mas por tipos de consumidor, os publicitários reconhecem que campanhas como as que levaram os principais prêmios do festival são incipientes no Brasil. "O cliente brasileiro exige comunicação, mas paga apenas a veiculação", diz Antonio Fadiga, presidente da Fischer América.Outros problemas são prazo e verbas menores para as campanhas serem feitas no Brasil. "A qualidade da propaganda no Brasil não caiu, o mundo é que evoluiu", diz Valente.
FONTE: Folha de São Paulo
segunda-feira, 23 de junho de 2008
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